“Perdão pela demora. Eu estava resolvendo algumas coisas e tinha ido ao cartório pegar a certidão nova”. O relógio marcava 10h, quando tocou o alerta de mensagem no celular. Era Mathias de Lima, de 18 anos, uma das 685 pessoas trans assistidas pela Defensoria Pública da Paraíba (DPE-PB) em 2024, que respondia ao convite de participação desta reportagem. Ele havia procurado a Defensoria para dar um passo importante na busca por viver a sua verdade.
A história de Mathias foi inicialmente marcada por expectativas externas que não correspondiam à sua identidade. Aos 18 anos, depois que iniciou seu processo de autodescoberta e aceitação, sentiu que era hora de buscar seus direitos. Ele procurou a DPE-PB visando a alteração de prenome e gênero em seus documentos. “Desde o primeiro contato, fui acolhido e orientado pela equipe da Defensoria. Ela me ajudou a entender cada etapa e me deixou à vontade para tirar as minhas dúvidas. Com este apoio, consegui enfrentar o processo com mais tranquilidade”, contou.
Mathias esperava por esta conquista há muito tempo. A incerteza de como reagiriam a ela o deixava muito inseguro. No entanto, era preciso fazê-lo para narrar sua vida de uma nova forma. O jovem, que havia acabado de receber a Certidão de Nascimento com a alteração pedida, não conseguia conter a emoção. “Finalmente estou livre e feliz. Hoje, eu posso respirar com alívio. Muita coisa aconteceu durante essa incrível jornada de transição, eu me conheci e me reconheci”, celebrou.
Sentimento compartilhado também por Arlinda Trindade. Ela conta que participou de uma edição do mutirão “Meu direito começa pelo nome”, realizado pela Coordenadoria de Defesa dos Direitos Homoafetivos, da Diversidade Sexual e do Combate da Homofobia da DPE-PB, e que recebeu todo o apoio necessário para garantir seu direito. “Tive todo o auxílio e informação sobre como prosseguir no cartório. Em menos de cinco dias estava com a minha Certidão de Nascimento em mãos com o nome Arlinda Trindade dos Santos. Agradeço muito a Defensoria Pública”, disse.
PROCURA CRESCE – Só em 2024, a Coordenadoria da Diversidade registrou 685 atendimentos relacionados ao acesso à documentação básica. O número é 25% superior ao ano anterior, quando a Defensoria atendeu 547 pessoas. Os dados incluem alteração de prenome e gênero e acesso ao nome social e à segunda via da certidão.
Para a defensora pública Remédios Mendes, o aumento é fruto dos esforços em promover a cidadania e a dignidade a todos os paraibanos. “Os mutirões realizados nos últimos dois anos foram fundamentais para esse aumento. Mas é importante ressaltar que os mesmos serviços que ofertamos durante os mutirões estão disponíveis na Defensoria Pública durante todo o ano”, ressaltou a defensora pública.
Em João Pessoa, as pessoas podem procurar a Coordenadoria da Diversidade de segunda a sexta, das 8h às 13h. O atendimento é gratuito, como todo atendimento da Defensoria Pública. Os interessados deverão apresentar certidão de nascimento, certidão de casamento (se for o caso), RG e CPF, título de eleitor, comprovante de residência e certidões de protesto, que podem ser apresentadas posteriormente.
Nas demais comarcas do Estado, as pessoas podem procurar os Núcleos de Atendimento da DPE-PB. Os endereços estão disponíveis no site, na seção Locais de Atendimento.
GRATUIDADE – Em junho do ano passado, a entrega de quase 100 novas certidões às pessoas assistidas pela Defensoria Pública marcou o início de um importante avanço, garantindo que a população trans pudesse exercer sua cidadania de forma plena e digna. Por meio de articulações com a Corregedoria Geral de Justiça da Paraíba e os cartórios de protesto de João Pessoa, a Defensoria conquistou a gratuidade da emissão de certidões de protesto para os assistidos em situação de hipossuficiência residentes na capital. Esse direito pode ser acessado através da Coordenadoria da Diversidade.
SONHO QUE SE SONHA JUNTO – As histórias de Mathias e Arlinda ainda são exceções na Paraíba. Assim, as ações da Defensoria caminham em direção a realizar sonhos como o de Arlinda. “Esta conquista me trouxe novos sonhos de incentivar outras pessoas a correr atrás de seus direitos e de ter dignidade. Eu sonho em ver outras e outros iguais a mim tendo liberdade, sendo respeitados e o mais importante sendo amados e cuidados como merecemos”, ressaltou Arlinda Trindade.
DIA DA VISIBILIDADE TRANS – Em 29 de janeiro, é celebrado o Dia da Visibilidade Trans no Brasil. A data, criada em 2004, tem como objetivo reforçar a importância do respeito à identidade de gênero e conscientizar a sociedade sobre os direitos da população transgênero.
Texto: Luiz Filho
Fotos: Arquivo pessoal